Diante do problema das erosões constantes no litoral do Estado, a Assembleia Legislativa realizou audiência pública, nesta quarta-feira (21), para discutir o tema “Morro do Careca e os processos erosivos nas praias turísticas do Rio Grande do Norte”. Proposto pelo deputado Neilton Diógenes (PL), o debate objetivou alcançar soluções práticas e imediatas de combate à degradação do meio ambiente potiguar.
“O nosso Rio Grande do Norte enfrenta hoje um problema que está se agravando e traz uma implicação direta no meio ambiente, no Turismo e na Economia. As erosões no nosso litoral atingem hoje mais de 30 praias, em 13 cidades distintas, do litoral Norte ao Sul. O caso de maior notoriedade é o do Morro do Careca, principal cartão postal de Natal e do Estado como um todo. Mas, nesse lindo litoral potiguar de 400 quilômetros de costa, as erosões se multiplicam e ameaçam a fauna, a flora e diversos setores da nossa sociedade”, iniciou o propositor do debate.
O deputado Neilton destacou que as ameaças acontecem em diversas frentes, prejudicando o meio ambiente, a atividade turística e, consequentemente, a Economia de todo o Estado.
“Com relação aos impactos ambientais, sabemos que as construções de grandes barragens nos rios fazem com que a areia não chegue aos oceanos. Da mesma forma, as construções em áreas de costa, como calçadões e muros de arrimo, intensificam o processo erosivo. Por fim, as mudanças climáticas, com a elevação do nível do mar, agregam mais complexidade a essa discussão ambiental. Do ponto de vista do Turismo, o litoral potiguar corre risco de sofrer grandes mudanças no seu cenário com a intensificação dessas erosões. E isso acaba gerando grandes impactos também na Economia, afinal, a atividade turística representa 15% do nosso Produto Interno Bruto”, detalhou.
Segundo o parlamentar, há uma exigência sobre os municípios costeiros para que reforcem as fiscalizações e a atuação da Defesa Civil nas encostas; e a respeito dos órgãos ambientais, é preciso dar maior celeridade aos processos, para que ações de intervenção e contenção das erosões possam ser feitas o quanto antes.
“De um modo geral, eu fico triste ao notar que perdemos muito tempo discutindo competências entre órgãos de licenciamento. É inadmissível que isso se torne uma discussão longa, burocrática e política. Então, eu faço um apelo para que possamos deixar as diferenças de lado, sejam elas políticas ou não, para que possamos construir soluções exequíveis e urgentes neste debate”, concluiu.
Em seguida, os professores da UFRN, Rodrigo de Freitas e Venerando Eustaquio Amaro, fizeram uma explanação completa sobre as causas do problema, dando exemplos com relação a algumas áreas e apontando as possíveis soluções.
Rodrigo de Freitas disse que o tema é muito relevante para a sociedade potiguar, “pois estamos perdendo praias e outras infraestruturas”.
“É preciso enfrentar o problema de forma conjunta, senão iremos sofrer as consequências da erosão que está se intensificando, devido a três grandes fatores: redução do aporte de sedimentos, ou seja, diminuição da quantidade de areia; uso desordenado do solo nas áreas de orla; mudanças climáticas e elevação do nível do mar”, explicou.
A respeito do aumento do nível do mar no Nordeste, o professor Venerando elucidou que isso indica que nós iremos enfrentar, num prazo muito curto, crescimento das ondas, maior amplitude das marés e aumento cada vez maior do nível médio do mar.
“E tudo isso está acontecendo no litoral do Rio Grande do Norte hoje. É importante que tenhamos em mente que as mudanças climáticas já alcançaram a nossa geração, e nós precisamos ter ações imediatas sobre isso. E os efeitos são esses que estamos vendo: erosões, quedas e deslizamentos de massas nas falésias. Então, nós precisamos encontrar soluções adequadas e definitivas ou, pelo menos, de longo prazo”, finalizou.
De acordo com o Procurador da República Vítor Mariz, representante do Ministério Público Federal (MPF), o Morro do Careca é um bem da União, que foi tombado como monumento paisagístico cultural e integra uma Zona da Proteção Ambiental.
“O Ministério Público começou a receber, nos últimos meses, denúncias e informações mais acentuadas a respeito da situação precária do morro. Mas essa luta pela defesa do Morro do Careca data de 1997. Nessa época, uma Ação Civil Pública foi instaurada na Justiça Federal, resultando na interdição total do morro; na garantia do policiamento ostensivo e da fiscalização, com placas informativas e cercas de isolamento; além do pedido de elaboração de um plano de recuperação e preservação da área”, contou.
O procurador disse ainda que no início deste ano o MPF instaurou Inquérito Civil a respeito do tema e coordenou reuniões com órgãos públicos, como Ministério Público do RN, Idema, Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal (Semurb), Polícia Militar do RN e Ibama; requisitou vistorias e relatórios ao Idema, Semurb e Defesa Civil; e provocou a Defesa Civil Nacional e o Comando da Aeronáutica, em torno do assunto.
“Os relatórios evidenciaram um avançado processo erosivo, com perda acelerada de sedimentos; estrutura de fragilidade nas faces das falésias; risco de ruptura e movimento gravitacional de massa; e ainda um conjunto de fraturas e cortes, indicando áreas de ruptura e descontinuidade, com formação de lascas e fendas, além de cavidades nos sopés, o que indica um risco iminente de colapso, acarretando risco à vida e à integridade física das pessoas”, detalhou o procurador.
Concluindo, Vítor Mariz enfatizou que a situação é muito grave e exige ações cooperativas e um olhar para frente, para que todos possam chegar a uma solução em prol da preservação do meio ambiente potiguar.
Na sequência, o prefeito Álvaro Dias falou sobre as questões que envolvem a obra da chamada “engorda” da Praia de Ponta Negra, que é o alargamento da sua faixa de areia.
Inicialmente, o gestor municipal utilizou o exemplo de Balneário Camboriú, após visita recente feita com sua equipe, em que foram observadas as obras e todos puderam conhecer seus impactos positivos.
“O Turismo lá aumentou em quatro vezes. Também houve crescimento no comércio vizinho, um salto na geração de emprego e renda, ampliação das hospedagens, dos consumos em restaurantes, enfim, foi uma obra que trouxe muito desenvolvimento para a região”, argumentou.
“A Praia de Ponta Negra é visitada por nós desde criança, e estamos vendo o Morro do Careca, nosso cartão postal, sendo submetido a uma agressão violenta. Isso acontece pelo avanço do mar, que provoca o processo erosivo na sua base. E qual é a solução? É promover a engorda da praia, aumentando em 100 metros a faixa de areia na maré seca e em 50 metros na maré cheia. Nós temos o projeto pronto e temos os recursos. Só precisamos da autorização para iniciar a obra. Será que nós não vamos poder salvar o Morro do Careca, o nosso Turismo, os milhares de empregos que dependem dele na nossa cidade? Tudo isso devido à demora repetitiva em conceder a licença. Ela foi concedida tranquilamente em Fortaleza, em Maceió e em Balneário Camboriú. E nós estamos apenas aguardando isso para começar”, realçou.
O prefeito garantiu que irá continuar na luta pela aprovação do projeto, ressaltando que já convocou a “participação de entidades da sociedade civil organizada comprometidas com o progresso da cidade, em que foi analisado o problema e foram discutidas as soluções, da mesma forma que aconteceu com o plano diretor”.
“A principal fonte de emprego e renda do nosso Estado é o Turismo. Nós temos que aproveitar todo o potencial que a natureza nos deu e, mais ainda, continuar cuidando e preservando nossas belezas naturais. E é por isso que essa obra é tão importante para o nosso Rio Grande do Norte. Natal é a mola propulsora do RN. Os turistas vêm primeiro para cá e depois vão conhecer o restante do Estado. Então, por isso tudo, precisamos preservar e garantir a integridade do nosso Morro do Careca e do calçadão da praia de Ponta Negra, e estamos só aguardando a licença do Idema para isso”, disse.
Dando continuidade aos discursos, o deputado Kleber Rodrigues (PSDB) frisou a importância do Morro do Careca para a imagem do Rio Grande do Norte.
“Quando o turista pensa em Natal e no RN, ele lembra do Morro do Careca, da mesma forma que, quando se pensa no Rio de Janeiro, o Cristo Redentor vem à mente. Então, é preciso ter consciência da extrema relevância desse monumento natural, tanto por parte da sociedade quanto dos Poderes Públicos, para que algo tão importante não nos seja tomado pela erosão, como está acontecendo”, alertou o parlamentar.
Kleber disse ainda estar muito preocupado com a atual situação de Ponta Negra, já que, segundo ele, o Estado vive uma alta taxa de desemprego e sobrevive basicamente de micro e pequenos empreendedores.
“E boa parte desses empresários está na área de serviços, o que envolve a questão turística. Então, precisamos pensar em quantos milhares de empregos podem ser gerados quando essa situação de Ponta Negra for resolvida”, assinalou.
Para o secretário da Semurb, Thiago Mesquita, “o aterro hidráulico é a solução que nós temos”.
“A ‘engorda’ em Ponta Negra é necessária. A transformação será muito positiva do ponto de vista social e turístico, mas essa é uma intervenção necessária do ponto de vista ambiental. É preciso resistir a esse avanço natural e histórico. Toda essa situação nos preocupa muito”, frisou.
A respeito de toda a situação de espera junto ao Idema, o secretário informou que foi protocolado, junto ao referido órgão, um estudo de viabilidade técnica e ambiental, ainda em 2015, baseado em pesquisas do professor Venerando, pela UFRN.
“Esses estudos apontaram que era preciso haver intervenção através de três grandes projetos na orla de Ponta Negra: o enrocamento, a reformulação da drenagem e o aterro hidráulico propriamente dito. Então, após algumas previsões matemáticas, nós estimamos, no mínimo, 50 metros de areia com a maré cheia, podendo ultrapassar 100 metros com ela seca. Nós escolhemos uma jazida de 7 milhões de metros cúbicos de areia, mas para essa etapa inicial iremos precisar de apenas 1 milhão”, detalhou Thiago Mesquita.
Finalizando seu pronunciamento, o secretário destacou que, após as análises e estudos realizados, a equipe responsável entendeu que há uma necessidade de priorizar esse projeto.
“Nós estamos, desde setembro do ano passado, aguardando um posicionamento do Idema, nem que seja para apontar o que precisamos melhorar e até mesmo para indicar qualquer complementação necessária ao projeto. Isso seria muito importante para nós, porque tudo está dependendo da emissão da licença prévia pelo órgão. Então, nós fazemos um apelo respeitoso a toda a equipe técnica do IDEMA e do IBAMA, para que possamos dar continuidade a esse projeto”, concluiu.
Já o Diretor-geral do Idema, Leon Aguiar, iniciou sua fala garantindo que o órgão tem um interesse muito grande no tema, por toda sua representatividade junto ao povo do RN e pelo reconhecimento internacional do Morro do Careca e da Praia de Ponta Negra.
Na sequência, ele fez um breve histórico sobre a praia e o morro, frisando que jamais aceitaria, enquanto natalense e gestor de um órgão técnico, qualquer tipo de morosidade envolvendo essa questão.
“Esses anúncios de recursos só estão garantidos, de 2019 para cá, porque o IDEMA, dialogando com a prefeitura, entendeu que poderia desmembrar parte do licenciamento do enrocamento, a fim de salvaguardar os recursos que estavam garantidos pela União”, enfatizou.
A respeito do projeto de engorda da praia, o diretor do IDEMA esclareceu que em 2015 foi enviado o pedido, mas não com todos os subsídios necessários a um processo de licenciamento.
“E à época o IDEMA emitiu um Termo de Referência para que fosse feito um Estudo de Impacto Ambiental, que é exigido por lei. Em 2022, foi apresentado o projeto e nós fizemos uma audiência pública com a população local, que inclusive mudou o curso da história, porque as pessoas que trabalham e moram ali não aceitaram o projeto do jeito que estava. Portanto, licenciamento é isso: ouvir, debater, estudar, sofrer questionamentos de ordem técnica, legislativa e, com tudo isso, ir construindo informações”, explicou.
Leon Aguiar disse ainda que foi preciso solicitar autorização do IBAMA para dar continuidade ao processo de licenciamento de maneira local.
“A partir de certo ponto do processo, nós tivemos a preocupação de entrar na seara do IBAMA sem autorização. Então, precisamos pedir essa autorização para que possamos continuar com a análise e posterior concessão da licença, mas ainda estamos aguardando uma resposta formal da instituição. Atualmente, nós continuamos com os nossos estudos, com uma equipe de 20 pessoas, porque queremos deixar o processo pronto. A análise do processo será concluída até, no máximo, semana que vem, mas já sabemos que vamos pedir alguns esclarecimentos técnicos, especialmente acerca dos impactos na fauna e nos aspectos socioeconômicos”, disse.
Ao final do seu discurso, o Diretor-geral ressaltou que o objetivo do IDEMA é facilitar a execução da obra, mas sem esquecer suas responsabilidades com o meio ambiente e a população potiguar.
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