Oportunidades e riscos ambientais, sociais e de governança visando o desenvolvimento sustentável do Rio Grande do Norte. Essa foi a pauta das discussões, na Assembleia Legislativa, na tarde desta quarta-feira (12). O debate ocorreu em audiência pública proposta pela Frente Parlamentar Estadual para Gestão Inteligente e Sustentável, que reuniu autoridades do Governo do Estado, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Nacional do Semiárido (INSA), Idema/RN (Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente), além de membros de instituições de ensino federais e estaduais e entidades representativas do Comércio e da Indústria.
“O debate de hoje vai tratar de um assunto muito atual, aqui e em todo o mundo: como compatibilizar desenvolvimento com os cuidados e os riscos, do ponto de vista ambiental, social e da governança. Tudo em busca daquilo que todos nós desejamos, que é o desenvolvimento com sustentabilidade”, registrou o parlamentar Hermano Morais (PV).
O administrador e especialista no tema da audiência pública, Dirceu Simabucuru, iniciou sua palestra abordando questões, como emergência e resiliência climática.
“De acordo com uma pesquisa da Edelman Trust Barometer, de 2024, o medo das mudanças climáticas atinge 82% das pessoas no Brasil. No mundo, a realidade não é diferente: 76% dos cidadãos estão preocupados com a problemática. Ainda conforme a pesquisa, o Brasil é o segundo País do mundo mais preocupado com as mudanças climáticas, ficando atrás apenas do México. E a responsabilidade para lidar com esse problema, de acordo com 77% dos brasileiros, é dos governos federal e estaduais. O que os nossos líderes irão fazer diante desse cenário é algo que está sendo discutido em Brasília, atualmente”, revelou.
Segundo o especialista, dados recentes a respeito das enchentes do Rio Grande do Sul mostram que 99% da população acredita que as mudanças climáticas estão relacionadas à tragédia.
“Portanto, nós não temos negacionistas climáticos, o que é muito importante, porque dá foco para as ações que devem ser tomadas”, complementou.
Em seguida, ele explicou o significado da sigla ESG (do inglês Environmental, Social, Governance), que no Brasil se traduz como “Ambiental, Social e de Governança”.
“De forma resumida, essa sigla surgiu na ONU, em 2005, quando se discutiu o que as empresas iriam fazer diante das questões ambientais e sociais, no mundo inteiro. A problemática ganhou mais força após a pandemia da Covid-19. Para se ter uma ideia, os investimentos em ‘ESG e Sustentabilidade’ irão atingir 53 trilhões de dólares em 2025. Isso é mais que um terço do capital circulante no mundo. No Brasil, foram investidos 2 bilhões de dólares, em 2023, distribuídos entre 59 Fundos de Investimentos Sustentáveis”, detalhou.
Continuando sua explanação, o palestrante divulgou dados sobre prejuízos, no Brasil e no mundo, provocados pelas mudanças climáticas.
“Nos primeiros nove meses de 2023, o total de perdas no mundo todo foi de 295 bilhões de dólares. Aqui no Brasil, no ano de 2022, foram perdidos 16,5 bilhões de dólares no setor Agropecuário”, revelou, acrescentando que no cenário econômico atual “ou a empresa se adequa
às questões ambientais ou ela está fora do jogo”.
Finalizando sua apresentação, Dirceu Simabucuru destacou que o mundo inteiro sabe que o principal ator das questões de Sustentabilidade e das emergências climáticas, que pode contribuir para diminuir os impactos ambientais, é o Brasil.
“Isso tudo devido à nossa descarbonização e crescimento sustentável; energias renováveis e hidrogênio verde; biomassa e biocombustíveis; mercado de carbono; e nossa infraestrutura e investimentos. A questão de se abrir uma indústria aqui no nosso País, por exemplo, é a seguinte: na pontuação de ESG, a empresa vai emitir muito menos gases de efeito estufa, apenas por usar a matriz elétrica do Brasil, que é mais de 80% de energia renovável (hidrelétricas, fotovoltaica, eólica etc). Então, se uma empresa abre aqui, ela é bem menos poluidora do que se abrir na China, por exemplo, porque lá a energia elétrica é à base de carvão. E essas instalações podem nos trazer o capital necessário para a nossa resiliência climática”, concluiu, acrescentando que “para atrair investimentos para o Brasil, é preciso debater melhor as questões legislativas e de políticas de governança, alinhando-se às normas internacionais, que estão olhando cada vez mais para os impactos ambientais e sociais”.
O secretário estadual do Desenvolvimento Econômico, da Ciência, da Tecnologia e da Inovação, Silvio Fernandes, garantiu que os membros do Governo do Estado estão a todo momento atentos aos problemas climáticos que vêm acontecendo mundialmente.
“Estamos há dez anos na liderança brasileira de produção de energia eólica, o que é um marco importante, mas não é por isso que devemos nos esquecer da Sustentabilidade e dos problemas de desertificação que acometem o nosso Estado”, frisou.
O secretário lembrou que a Comissão de Meio Ambiente do Senado Federal aprovou o “Marco Legal do Hidrogênio Verde”, o qual, segundo ele, será a nova fronteira de desenvolvimento do RN.
“Nós já temos 14 projetos de energia eólica off-shore, junto ao Ibama, para a produção de hidrogênio verde. Mas, apesar dos grandes investimentos, não arredamos o pé de conservarmos o nosso meio ambiente”, argumentou.
Na sequência, o presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do RN, Marcelo Fernandes, reforçou que “a Fecomércio é signatária do ‘Programa Ecos’, iniciativa do Sistema CNC/SESC/SENAC que tem sido uma plataforma essencial para implementar ações mitigadoras dos impactos socioambientais, além de promover a conscientização entre nossos colaboradores e a comunidade”.
Para Rivaldo Fernandes, superintendente do Ibama no RN, “a discussão sobre o futuro está praticamente apagada dentro das universidades, entre os partidos políticos e outros setores da sociedade”.
“E a iniciativa de hoje, diferentemente, volta-se para esse tipo de discussão e começa a nos fazer refletir sobre o futuro do Rio Grande do Norte. A crise é muito grande, pois o consumo está ligado à destruição e à guerra. O sistema capitalista hoje promove as guerras, a fim de vender armas; e o consumo exagerado, que destrói o meio ambiente. Porém, os recursos são finitos, e a natureza não acompanha essa velocidade. Mas o sistema não está preocupado com isso. O que move o mundo hoje, infelizmente, é o lucro e outros interesses que não as necessidades das populações”, destacou.
O coordenador de pesquisas do Instituto Nacional do Semiárido (INSA), Emmanuel Moreira, contou que o órgão vem desenvolvendo tecnologias aplicadas à Sustentabilidade do Semiárido brasileiro.
“O INSA tem a missão de ser agente transformador, trazendo desenvolvimento social e econômico para o Semiárido brasileiro, que possui cerca de um milhão de quilômetros quadrados, englobando em torno de 1400 municípios. E o processo de desertificação está cada vez mais desenfreado, então precisamos ter tecnologias para realizar ações de mitigações desse processo. Uma dessas tecnologias é a SARA, que significa ‘Saneamento Ambiental Rural Sustentável’ e possui a proposta de reutilização de água, para consumo e produção agrícola”, disse.
A professora da UFRN, Rosimeire Cavalcante, que faz parte do Grupo de Estudo em Energia da Biomassa (GEEB), apresentou informações gerais sobre o Estado em termos de Meio Ambiente e falou sobre o nível de consumo e importância da lenha para a Economia do RN.
“Nós temos a maior produção de energia eólica do Brasil, mas, em termos de consumo, nenhuma outra fonte é tão importante quanto a lenha aqui no Estado, porque ela é a mais barata. Além disso, a lenha é a segunda maior fonte de energia do RN, depois da eletricidade”, afirmou.
A pesquisadora disse ainda que o consumo da lenha no Estado se dá, principalmente, para uso domiciliar, produção de cerâmica vermelha, produção de farinha de mandioca, em padarias, pizzarias e nas produções de queijo e manteiga do sertão.
O secretário de Desenvolvimento Rural e da Agricultura Familiar, Alexandre de Oliveira, ressaltou que, quando se trata da questão ambiental, dois marcos são muito relevantes a nível mundial: a Revolução Industrial e o momento Pós-Segunda Guerra.
“A Revolução Industrial criou as condições objetivas para a sociedade desenvolver um modo de produção em larga escala, a fim de atender às necessidades humanas; outro ponto é o Pós-Segunda Guerra, quando foi efetivado todo o desenvolvimento tecnológico ligado à Agricultura e se desenvolveu a nossa atual forma de produção”, detalhou.
De acordo com Alexandre de Oliveira, que também é professor universitário, o que está estabelecido hoje como consenso internacional é que todo esse paradigma já se desmoronou, e existe a necessidade de se rever a forma de produção.
“Cada vez mais a sociedade cobra das empresas quais são seus mecanismos de produção, em toda sua cadeia. Também há a questão dos padrões de consumo. A atual crise climática não está relacionada aos países pobres, mas aos padrões estabelecidos pelos ricos. São eles, inclusive, que não estão cumprindo os grandes acordos internacionais. E aí é que está a grande oportunidade do Brasil de se reposicionar no cenário econômico global, devido à sua capacidade de preservar boa parte da sua biodiversidade, não apenas na Amazônia, mas também aqui, na Caatinga”, finalizou.
O Procurador Federal Nilson Rodrigues, que também é coordenador nacional de Matéria de Qualidade Ambiental, assegurou que não deve existir dualidade entre desenvolvimento econômico e sustentabilidade, pois os dois são valores de ordem constitucional.
“A Ordem Econômica, prevista na Constituição Federal, e o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado são valores constitucionais. Além disso, a própria Ordem Econômica tem como princípio a defesa ao meio ambiente. Então, antes que possa parecer paradoxal e complicado, é bom ressaltar que a Constituição trata esses valores de forma harmoniosa”, afirmou o procurador.
Diretora do Núcleo de Desertificação e Mudanças Climáticas do Idema, Wanessa Dunga iniciou sua fala discorrendo sobre a importância e o protagonismo feminino na causa climática e, em seguida, destacou a função da sua entidade no cenário ambiental do Estado.
“O nosso núcleo foi recém-criado pelo Idema, diante da urgente necessidade de se debater essa questão dentro do RN. A questão climática, então, é uma preocupação real do Estado, para que a gente faça uma transição energética limpa, lidando com todas as suas questões econômicas, mas que não deixe de lado as problemáticas ambientais e sociais”, concluiu.
Deixe um comentário